A Banalidade do Mal, por Mauro Sérgio Santos
ter, 17 de fevereiro de 2015 00:06* Mauro Sérgio Santos
Hannah Arendt, pensadora judia nascida na Alemanha em 1906. Foi aluna dos filósofos Heidegger, Jaspers e Husserl. Fugindo do nazismo, exila-se nos EUA, onde permanece até o fim de sua vida, em 1975.
Na década de 1960, Arendt se oferece para cobrir o julgamento de um burocrata nazista chamado Eichmann, um dos responsáveis pela chamada solução final: a ideia de extermínio total dos judeus.
Esperava-se de Arendt, na condição de judia, uma reportagem emocional que desvelasse o monstro nazista. A autora, entretanto, no relato do julgamento surpreende a todos, demonstrando que Eichmann era, tão somente, um homem superficial: burocrata, pai de família que cumpria ordens sem reflexão e questionamento; e que tal superficialidade o leva a fazer parte de uma engrenagem produtora da barbaridade.
A filósofa defende que uma sociedade superficial facilmente produz o mal que se torna banal, corriqueiro, cotidiano, sem relevância. Um determinado sistema social imposto, como o regime nazista,foi capaz de gerar um comportamento mal em milhares de pessoas. O sistema leva pessoas comuns a praticarem a barbárie.
De Arendt até nossos dias, passamos da banalização do mal à sua glamourização. Nas produções cinematográficas e nas telenovelas, por exemplo, há uma inversão de valores das figuras em questão assimiladas pelos telespectadores, em face da superficialidade social. Frequentemente, o mocinho é apresentado como alguém insosso, inglório, sofredor. Ao passo que o vilão passa a ser o protagonista, o centro das atenções, bem sucedido, bem humorado etc. O herói, para ser popular precisa ter, nesses enredos, certa dose de ironia e malícia sob a pena de ser ridicularizado e/ou negligenciado. Mais grave ainda são os noticiários pseudo-investigativos que, como abutres, alimentam-se da carnificina alheia, da exposição da violência, da barbárie e do ridículo humano. Na busca desenfreada pela audiência de telespectadores, atuam como formadores de opinião na reprodução de discursos superficiais e, portanto de fácil assimilação. “Bandido bom é bandido morto”. “Os Direitos Humanos só protegem bandidos”. “As leis brasileiras são fracas.” “Chegamos ao fim do mundo”. “A pena de morte é a única alternativa” (…)
Discursos ultraconservadores em relação aos direitos humanos, “escatologias de botequim” marcadas por um pessimismo gratuito. Exposição exacerbada da violência como instrumento de catarse e entretenimento (sim, entretenimento!) Propagação da intolerância em relação ao diferente. Fortalecimento do elitismo, do racismo, da homofobia, da discriminação.
O simplismo de tais discursos absorve as massas justamente porque é superficial e sem fundamentação. A prática do bem exige reflexão. O mal é fruto do tacanho e medíocre, da irreflexão.
“Meus heróis morreram de overdose. Meus inimigos estão no poder”(CAZUZA)
*Professor de Filosofia; Mestrando em Filosofia; Especialista em Educação e autor do livro ‘Camaleão: metapoesia’
Blog: http://banquetedepetras.blogspot.com
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