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Opinião: Tragédia palhaço, por Inocêncio Nóbrega

ter, 28 de janeiro de 2014 00:00

 * Inocêncio Nóbrega

Gritos de dor partiam do interior da Boate Kiss, rua dos Andrada,  em Santa Maria (RS), na madrugada de 27 de janeiro, ano passado.     Um evento organizado por jovens, primordialmente universitários, e ali estavam mais de 200 deles. Ao todo cerca de 1.500 pessoas, para uma capacidade máxima de mil, num ambiente de 615m2, de corredor estreito e uma única porta de acesso e saída. Durante o espetáculo, membro do grupo musical mira um sinalizador, para o teto de revestimento acústico a espuma sintética. Irrompe-se um incêndio. Sem número suficiente de extintores, inicia-se um processo de tumulto, em meio a uma sensação térmica de 500º, poucos conseguem escapar. Apenas 42 continuam a lutar pela sobrevivência, nas mãos de 28 dedicados profissionais, entre médicos, psicólogos, fisioterapeutas, instalados num Laboratório Especial, sob os auspícios do governo federal. Prevê-se, na maioria dos casos, cinco anos de tratamento, para que a fuligem, inoculada nos pulmões de cada um, proveniente dos gases tóxicos, seja expelida. Precisamente 242 foram as vítimas fatais.

A terapêutica jurídica, entretanto, é morosa. Até aqui ninguém foi punido e indenizado. Li que o prefeito do município acaba de sancionar lei, exigindo dentro de curto prazo, que as casas noturnas da cidade marquem seus “acentos”. Todavia, o diploma legal experimentará nova votação na Câmara de Vereadores, após o recesso, a fim de que o erro gramatical seja devidamente corrigido. Afora isso, algumas homenagens estão acontecendo nesse período, ao menos para aliviarem o sofrimento de familiares, pela perda de seus entes queridos.

Menos sorte tiveram 257 brasileiros, quinze a mais, de Belém, capital do Pará. Eles se opunham à ideologia de Pedro I, qual seja de buscar-se uma independência para o Brasil, sem largar a afinidade com os Bragança. Cabia-lhe presidir os destinos da nova nação. Assim ele fez e continua, ainda hoje, pela bragantinagem interna norte-americana. Foram obrigados, pelo mercenário Grenfell, para ali destacado com o objetivo de conter o ímpeto do patriotismo paraense, a adentrarem no porão do brigue “Palhaço”, o qual teve todas as escotilhas fechadas, ainda por cima jogando-se-lhes cal virgem, nessa situação passando toda noite de 22 de outubro de 1823, ocasionando a morte, também por asfixia, de todos eles. Antes dos mesmos, cinco foram executados, por protestarem contra a programada chacina.

Os autores das duas tragédias não sofreram punições. É o chamado efeito-vinculante. Muito menos nossos patrícios, que perderam a vida  em circunstâncias tão odiosas, jamais são lembrados. Mas eu e meus gratos leitores fazemos, neste espaço, o merecido registro, que a historiografia oficiosa esquece.

    *Jornalista / inocnf@gmail.com

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