Doenças em época de Carnaval
sex, 28 de fevereiro de 2014 00:00
1-Quais são as pecularidades do Carnaval?
“Beija, beija, tá calor, tá calor”. O refrão da música baiana anuncia o que todo mundo já sabe: Carnaval é época de temperatura alta e muito beijo na boca. Mas para aproveitar a festa com saúde, os especialistas orientam a ter cautela na hora da curtição.
— É muito comum ver os jovens fazendo rankings de ‘’quem pegou mais’’. Essa prática, porém, aumenta as chances de contrair doenças como a mononucleose.
A mononucleose — ou “febre do beijo” — é uma doença viral com sintomas parecidos com os da gripe: febre alta, dor ao engolir, tosse, cansaço, falta de apetite, dor de cabeça, entre outros.
— Trocamos em torno de 250 bactérias e alguns vírus quando beijamos alguém. No caso da mononucleose, a pessoa leva o vírus para o resto da vida.
Outra medida fundamental, não só no Carnaval, é o uso de preservativos.
Com o excesso de bebida, os foliões acabam deixando de se proteger. Isso é perigoso, pois o sexo sem camisinha expõe a pessoa a doenças graves e sem cura, como o HIV.
Entre as doenças sexualmente transmissíveis estão as hepatites B e C (que podem evoluir para câncer de fígado) e o HPV (relacionado a tumores de útero).
Se a “beijação” merece cuidados especiais, outras medidas também contribuem para um carnaval mais seguro e saudável. Uma delas é o cuidado com os pés.
— Nos blocos e nos clubes, nas piscinas, as pessoas costumam usar sandálias ou ficam descalças. Um corte no pé pode provocar uma contaminação pelo micro-organismo causador do tétano.
Em caso de ferimentos, o folião deve procurar um hospital para higienizar o machucado e avaliar o risco para o tétano. Manter a vacinação em dia é outra forma de se livrar desse problema. A imunização é feita em três doses e deve ser repetida a cada dez anos em adultos.
2-Quais são as doenças mais comuns nesse período?
Os temas que mais estão tratando nos últimos três meses, tanto em preparação para a Copa do Mundo quanto para o carnaval, são as doenças respiratórias – tentar fazer com que o médico diferencie o resfriado comum da gripe, que é causada pelo vírus Influenza, e que pode levar à morte, diferente do resfriado. Então os médicos e enfermeiras devem estar preparados para a rápida identificação da influenza A, B, em especial a H1N1(antigamente chamada de gripe suina). Depois, tem os quadros intestinais, diarreias, muito comuns no período pós-carnaval – é orientado quando internar ou não, usa-se ou não antibiótico. Lembrando que o mau uso do antibiótico não prejudica somente a pessoa, mas toda a comunidade, porque se cria o que chamamos de resistência bacteriana. Também falamos sobre as Doenças Sexualmente Transmissíveis (DSTs), como identificá-las, a questão do HIV. Orientação, principalmente da população jovem, sobre o uso do preservativo.
3-E no caso de doenças que vem de fora, como H1N1, sempre há também essa preocupação?
Nós temos a H1N1 durante todo o ano no Brasil, mais comum no inverno e agora, no Carnaval, devido à aglomeração de pessoas. Como se trata de uma doença de transmissão respiratória, então acaba sendo passada de forma mais fácil em locais fechados, aglomerações. A imunidade geralmente está baixa nesse período. Então risco há. Em alguns países, a doença não está tão controlada como aqui. A política de vacinação do governo federal, por incrível que pareça, funciona. Hoje são disponibilizadas diversas vacinas, entre elas a H1N1. Lógico que não é liberada para todos os grupos, só os selecionados, mas que tiveram importância, sim, na redução da incidência dessa doença. Mas há risco sem sombra de dúvida. Lembrar que na Ásia agora estava circulando o H7N9, que é o novo vírus da Influenza, que tem o risco de vir, e nós estamos preparados para isso. Também estamos de olho no sarampo, porque ainda circula muito na Europa e na Ásia.
4-Como é o comportamento de risco que a população se coloca e que poderia ser evitado de alguma forma?
Carnaval, como o verão, reúne situações que são mais suscetíveis à transmissão de doenças. Primeiro a privação do sono, que as pessoas não dormem como deveriam, e sabemos que o sono é fundamental para que você tenha o sistema imune preparado para invasões externas por vírus e bactérias; nós temos os esforços extra habituais; tem gente que vem malhando pesado desde o fim do ano para chegar com um corpo bacana no Carnaval, mas exagera, o que os torna mais suscetíveis a doenças; o uso de substâncias proibidas; pessoas que não fizeram nenhum exercício físico durante o ano, mas querem aproveitar o bloco durante oito horas, ou camarote porque pagaram; pessoas que não se alimentam de maneira equilibrada, que vêem o Carnaval como a época do “tudo posso”, ingerindo alimentos diferentes… E aí entra o fenômeno dos “all inclusive”. Como a pessoa paga caro, ela quer comer de tudo para justificar o dinheiro dela naquilo ali, e isso é um perigo. A hidratação não é a mesma – alguns engraçadinhos acham que álcool hidrata, mas isso não é verdade. O que hidrata é água, suco ou bebidas isotônicas. Outra coisa: são pessoas do mundo todo reunidas, da Europa, América, e essas pessoas trazem doenças de lá. E, principalmente, a questão da higiene durante o Carnaval. Os banheiros químicos não têm locais para lavar as mãos. Então você entra no banheiro, não lava a mão, e vai comer algum alimento e pode acabar o contaminando. Outra coisa que vale a pena lembrar é a questão da vacinação, que deve ser feita antes, para tétano, hepatite A ou B. O que é mais comum nessa época? Doenças respiratórias, a conjuntivite – que pode ser por viral ou até alérgica, por causa da fumaça, espuma de Carnaval – e os quadros de diarreia, principalmente por alimentos que não foram condicionados da melhor forma. Às vezes a comida foi levada no período da tarde (o que acontece muito nos camarotes), e teve todo o cuidado na hora do preparo, mas não no acondicionamento.
5-Esse problema ocorre também nos camarotes nas festas espalhadas em todo Brasil?
Não podemos afirmar com certeza, porque como disse esses casos não são notificados, mas temos casos, sim, em emergências particulares e públicas, de pessoas que falam “eu não tive nada de diferente a não ser a comida do camarote”. Então como eu disse, muitas vezes não é problema no preparo – a maioria das empresas é terceirizada, muitas vezes restaurantes de nível bom – mas o problema é o acondicionamento. Imagine que tem espaços desses com duas, três mil pessoas. Como acondicionar alimento durante todo esse período? Outra coisa: quem está despachando esses alimentos? Camarote nem tanto, mas na rua a pessoa pega o dinheiro, depois pega a comida… Ela não tem onde lavar a mão.
6-E os banheiros químicos?
Sabe-se que pessoas que estão na rua não têm como ir a banheiros do camarote, ou em um apartamento que alguém alugou, então elas vão usar o banheiro químico, ou até mesmo a própria rua. Então se a pessoa estiver com uma doença infectocontagiosa, uma parasitose intestinal ou até hepatite A, vai transmitir. A doença demora de 15 a 42 dias para manifestar seus sintomas, que vão de icterícia (aparência amarelada na pele e nos olhos) à prostração.
— Uma dica para reduzir esse risco é levar um vidro pequeno de álcool em gel no bolso ou na bolsa para higienização das mãos sempre que for ao banheiro. Não vou falar que é por causa do Carnaval somente, seria leviano. Ainda tem a questão da intolerância alimentar – muitas pessoas não estão acostumadas com o tempero nordestino, digamos assim, e acabam experimentando uma moqueca, um acarajé, ou uma comida mineira e acabam tendo intolerância alimentar. Isso não é uma infecção, é quando a mucosa dela não está adaptada para absorver aquele tipo de alimento.
7-Em quanto tempo a pessoa pode desenvolver os sintomas?
Na medicina existe uma coisa chamada período de incubação, que é o período em que você teve contato com aquele agente, seja bactéria, vírus ou fungo, até você desenvolver a doença. Um exemplo: vamos dizer que daqui a 25 dias uma pessoa apresente febre, dor de cabeça e dor no corpo, principalmente na panturrilha. Ele vai ao médico, que pergunta “Nos últimos 15 dias, você teve contato com água de esgoto?” e ele vai dizer “Não, não tive. Só no Carnaval, que choveu e eu acabei pisando na lama, mas não pode ser”. Pode. O período de leptospirose vai de 1 a 28 dias. Então é importante para o profissional médico que estiver atuando saber esse período de incubação. E voltando à sua pergunta, a maioria das doenças transmitidas no Carnaval têm um período de incubação de 1 a 4 dias. Muitas pessoas chegam no primeiro dia de Carnaval e adoecem e acham que foi nesse dia, quando provavelmente já estava doente antes. Porque o período de incubação é de, no mínimo, 24h.
8-O fato de dormir as oito horas, mas pela tarde ao invés do período noturno, também interfere?
Interfere. Mesmo que você durma as oito horas, não compensa, porque você não está acostumado a isso. Pessoas que trabalham à noite têm até desenvolvido mecanismos de adaptação, mas nunca é normal o sono que você não tem no período noturno. Não é, porque existe uma coisa chamada “ritmo circadiano”, em que você produz mais hormônios e outras substâncias naquele determinado horário. Por isso que às vezes uma pessoa dorme oito horas ou até mais e não se sente tão descansado.
9-Qual a relação álcool, drogas e DST´s?
No Carnaval muitos abusam de bebidas alcoólicas e drogas para ficarem ‘ligados’. Aí começa o perigo: calor, corpo exposto, a sensualidade da dança, tudo isso fomenta a atração.
Álcool e drogas podem gerar uma estimulação dos sentidos e até dos desejos, mas geram também um rebaixamento de consciência, uma redução na preocupação consigo mesmo e aumenta os riscos; é importante que todos tenham consciência que o Carnaval é uma brincadeira e deve ser prazerosa, mas DST não é uma brincadeira; respeite seu corpo e sua vida, brinque com responsabilidade. Não tenha medo de ser careta, não abuse do álcool e evite as drogas. Careta é aquele que não se protege, a moda é ser saudável.
Usar camisinha sempre só mostra que você sabe que quer o melhor da vida e tem tudo para se dar sempre bem!
10-E o que você, sugere para essas pessoas que vão curtir o Carnaval e querem terminar a folia bem?
Não adianta se preparar um ou dois meses antes da festa para o que você não fez o ano todo. Você não vai adquirir massa muscular ou ficar com o corpo perfeito em tão pouco tempo. Fazer uso de substâncias proibidas, como anabolizantes, é uma bobagem maior ainda. Então a primeira coisa que se orienta é que, antes do Carnaval, mantenha seu ritmo de vida. Pode até aumentar um pouco a atividade física, mas com cuidado, com a orientação de um profissional de educação física e nutricionista. Além disso, procurar dormir bem, tentar descansar durante o dia, para que seu sistema imune volte a ter força. A alimentação nesse período tem que ser leve, rica em carboidratos, que dão energia rápido. Evite alimentos gordurosos e frituras, que possuem uma digestão mais difícil. A hidratação é de fundamental importância. A cerveja é líquido, mas a cevada é diurética, e o álcool volátil, então ela não hidrata. O ideal é água, isotônicos, água de coco. Tenha cuidado ao ingerir medicamentos com bebidas alcoólicas, que podem gerar reações. O paracetamol, por exemplo, quando ingerido com álcool, pode gerar uma hepatite medicamentosa. Cuidado com a higiene, lave sempre as mãos. Quem puder, leve seu recipiente com álcool em gel. Limpe a borda das latas com um guardanapo. Evite compartilhar talheres, copos… Cuidado com as maquiagens de graça que alguns camarotes oferecem, porque uma pessoa infectada pode ter usado a mesma esponja. Nunca compartilhe batom, que pode transmitir doenças. Evite compartilhar também toalhas, alicates e outros objetos perfuro-cortantes, que podem passar hepatite B – como há registro de vários casos. Lembre-se de se vacinar contra hepatite B, tétano… E, em caso de qualquer acidente, procure o posto de saúde mais próximo para receber as orientações dos médicos. Por fim, muito cuidado com os alimentos de rua, observando principalmente como eles foram preparados e armazenados.
11-Mas no Carnaval não dá para evitar o beijo. E aí?
Bem, ninguém estará com uma lanterna ou lupa olhando a boca da outra pessoa. E não adianta eu orientar “beijem menos”. É só aproveitar o Carnaval com cuidado. Não se esqueçam da camisinha. Existem os chamados “filhos do carnaval”, que as pessoas bebem e acabam se relacionando sem preservativos. Mas eu diria que um filho é o de menos, porque existem doenças crônicas, como hepatite, o HIV… Então use o preservativo, é de graça. Doenças do beijo também são muito comuns depois desta época, e muitas vezes não são diagnosticadas por profissionais de saúde, que não lidam com isso no dia a dia. Existe a mononucleose, que causa febre, dor de cabeça, dor no corpo, pode dar tosse e uma dor de garganta intensa. Então basta ter cuidado.
12-Você aposta que a gripe vai ser o “lepolepo” mesmo?
Eu não posso apostar que vai ter o nome da gripe. Mas diria que os quadros virais pós-carnaval são muito comuns. E comumente a imprensa apelida esses quadros de gripe com um hit do Carnaval. Então tivemos Dalila, Ziriguidum… E agora as pessoas apostam que deve ser “lepolepo”. Mas eu não posso dar nome a nada. Até porque, isso não é gripe. É mais uma virose, um resfriado comum.
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