Dra. Fabiane Saraiva do Nascimento

1-O que é Dependência Tecnológica?
A dependência de tecnológica do ponto de vista clínico é quando o indivíduo não consegue controlar o próprio uso da internet/jogos/smartphones, ocasionando sofrimento intenso e/ou prejuízo significativo em diversas áreas da vida. Cerca de 10% da população mundial sofrem de dependência tecnológica. Considerada uma epidemia moderna, a doença ainda é pouco estudada e ainda desconhecida pela maior parte da população e por profissionais de saúde.

2-Existe correlação com outras doenças?
Na maioria dos casos em que uma pessoa apresenta dependência tecnológica é possível identificar a presença concomitante de outro transtorno mental. Tecnicamente chama-se isso de comorbidade e as situações mais comumente associadas são ansiedade social ou timidez excessiva, depressão e Transtorno de Défict de Atenção e Hiperatividade (TDAH).

3-A adolescência normal é um fator de risco para dependência tecnológica?
Os jovens de hoje nasceram num mundo inundado pelas novas tecnologias e têm nelas um importante instrumento de socialização. A internet proporciona ao adolescente um espaço de experimentação onde ele se sente mais à vontade para por em prática as principais tarefas dessa fase da sua vida.  A desinibição (relacionada ao menor contato cara a cara) e o maior controle do que se mostra aos outros propiciam um ambiente muito menos angustiante ao jovem que se debate com a construção da própria identidade, o início da experimentação sexual e a independência dos pais (facilitada pela participação cada vez mais intensa no grupo de amigos).

Quando estas (e outras) dificuldades normais da adolescência se encontram intensificadas por qualquer motivo, alguns jovens podem acabar utilizando a internet não mais como um facilitador, por exemplo, do contato íntimo com outras pessoas, mas sim como a principal (e às vezes única) maneira de fazer isso.

4-Quais são os prejuízos causados pela dependência tecnológica?
Os prejuízos causados pela dependência tecnológica podem ocorrer na área escolar, como por exemplo, o indivíduo deixar de estudar, ficando em recuperação e até ser reprovado por ficar jogando ou navegando na internet; área social (deixar de sair com os amigos para ficar no computador); familiar (aumento dos conflitos devido ao uso intenso); e algumas vezes até físico (aumento do peso decorrente do sedentarismo). Esses problemas facilitam o desenvolvimento de depressão, ansiedade e agressividade.

5-Qual é o grande critério diagnóstico?
O grande critério para diagnóstico é o quando o mundo digital se sobrepõe a atividades do cotidiano e experiências de vida: por exemplo, se a pessoa prefere mandar e-mail a falar cara a cara ou comprar na internet a ir ao shopping.

6-Como é feito o tratamento?
Depois de ficar claro que existe um uso intenso e que está acarretando prejuízo significativo para o indivíduo, e, quando as tentativas de combinações e limites não são eficientes, é importante que se busque orientação especializada. O tratamento da dependência de tecnologia é fundamentalmente psicoterápico, não existindo até o momento nenhuma medicação aprovada para tratamento desse transtorno.
O tratamento psicoterapêutico (cognitivo comportamental, psicodinâmico, interpessoal ou outro) deve ser escolhido de modo individualizado e de acordo com o perfil de cada paciente e tipo de comorbidade associada.

7-Qual é o objetivo do tratamento?
O importante do tratamento não é a abstinência completa, pois isso nos dias de hoje poderia ser muito mais prejudicial do que benéfico. O objetivo principal do tratamento é o uso moderado, no qual a pessoa consegue obter os melhores benefícios dessas tecnologias, mas não apresenta mais o prejuízo decorrente de comportamento abusivo.

8-Quais são os grupos que atuam para compreender melhor o uso abusivo das tecnologias?
O GEAT (Grupo de Estudos sobre Adições Tecnológicas) surgiu em 2006, a partir da necessidade de tentar compreender como o crescente uso da internet e dos jogos eletrônicos estava influenciando a saúde mental e física de crianças e adolescentes. É formado por uma equipe multidisciplinar que atua nas áreas da psiquiatria, psicologia, nutrição, tecnologia da informação, comunicação, antropologia e educação.

Este grupo objetiva ajudar pais, professores e profissionais da saúde a estarem mais preparados para lidar com o desafio de criar e preparar seus filhos para um futuro imprevisível e cada vez mais tecnológico.

O grupo DELETE (Desintoxicação de tecnologia) pertence ao Instituto de Psiquiatria da Universidade Federal do Rio de Janeiro oferece tratamento gratuito com base em dez passos para uma desintoxicação (ou detox) digital.

9-Quais são os 10 passos criados pelo Grupo DELETE para o uso consciente das tecnologias?
1- É preciso bom senso para que o uso das tecnologias não se torne abuso no cotidiano;

2- Fique atento às consequências físicas (como privação de sono, dores na coluna, problemas de visão) e psicológicas (como depressão, angústia, ansiedade) devido ao uso abusivo;

3- Dose a prática do uso de tecnologias no cotidiano. Verifique se o seu desempenho acadêmico ou no trabalho está sendo prejudicado;

4- Reflita sobre hábitos cotidianos e faça diferente;

5- Não troque atividades ao ar livre por conectar-se;

6- Prefira uma vida social real à virtual, escolhendo relacionamentos/amizades reais, ao invés de virtuais;

7- Pratique exercícios físicos regularmente e faça intervalos durante o uso das tecnologias;

8- Não abale o seu humor com publicações virtuais. Não acredite em tudo o que é postado;

9- Valorize amigos reais e suas relações familiares;

10- Pense no meio ambiente: recicle os aparelhos e evite a troca frequente sem necessidade.