Charlie Hebdo e liberdade de expressão
qua, 14 de janeiro de 2015 00:02
A França mostrou ao mundo a maior manifestação popular da história no país neste domingo, 11, quando 3,7 milhões de pessoas, 5% da população, foram às ruas protestar contra o terrorismo e em defesa da liberdade de expressão. Na série de ataques que começou com o atentado ao “Charlie Hebdo”, 20 pessoas morreram.
Que a internet parece uma infinita Ilha das Flores não há dúvida. Mesmo sabendo disso, a estupidez e a ignorância de alguns comentários são de deixar estarrecida qualquer pessoa que tenha o mínimo de bom senso, então resolvi me manifestar. Lembrando que dúvidas e sugestões sobre a Meio Desligado são muito bem vindas no e-mail: talita@gazetadotriangulo.com.br.
Liberdade de expressão seletiva: do Carlos Latuff a gente não espera nada mesmo, mas dessa vez ele se superou. “Não vejo como crítica ao islamismo uma charge de Maomé sem roupa, de quatro, com o traseiro para cima. Acho isso provocação religiosa rasteira. “Não sei se é cinismo, hipocrisia ou só dificuldade de raciocínio. Ele fez muitas charges bem ofensivas ao catolicismo e aos cristãos, mas para ele, crítica à religião tem dois pesos e duas medidas. Se for sobre o Islã é provocação rasteira, caso contrário, viva a liberdade de expressão.
O Laerte decepcionou, mas ao menos foi honesto. “Não acho que deve haver liberdade de expressão pra quem tá a fim de fomentar o ódio, o machismo, a homofobia e o racismo. Mas eu também sou a favor da liberdade de expressão – o humor sem liberdade de expressão morre.” No mínimo contraditório.
Culpabilização da vítima: “Creio que soubessem o vespeiro onde estavam se metendo, mas não esperavam uma reação dessa proporção”. Nessa declaração, Latuff deixa claro que eles sabiam do risco. Se eles sabiam, então os próprios chargistas e jornalistas incitaram essa morte trágica, que poderia ter sido evitada se eles não “brincassem com fogo.” Logo, as vítimas têm responsabilidade nisso. É o mesmo que pensar: “mulher de roupa curta sabe que está provocando o estuprador”. A questão é que eles defenderam, até o fim, o direito de expressar uma opinião, enquanto um grupo de fanáticos religiosos terroristas usa a força para conseguir o que quer.
Não sou Charlie, mas apoio Charlie: Charlie Hebdo era bem controverso. Pesquisando a respeito antes de opinar, achei a maioria das capas de extremo mau gosto, por isso não sou Charlie. Mas o fato de eu não gostar de uma coisa não quer dizer que ela deva ser destruída, ou que não possa existir. Por isso eu apoio Charlie. Porque a liberdade de expressão se trata disso: aceitar opiniões completamente opostas as suas, até aquilo que te enoja. As charges do Latuff chegam a dar vergonha alheia de tão infantis, mas defendo o direito dele de fazê-las. Não existe essa de “Eu sou a favor da liberdade de expressão, mas em certos casos…”. No Brasil, uma revista como essa nunca existiria.
Esquerdinhas esquizofrênicos: esquerdistas estão aflitos com uma possível ascensão da “extrema-direita que apoia a islamofobia” na França. Os líderes do movimento deixam bem clara a distinção entre fundamentalismo islâmico e “cidadãos muçulmanos que compartilham valores franceses”. Porém, é no mínimo preocupante que as autoridades religiosas muçulmanas de maior importância não tenham se manifestado sobre o ataque. Muito se fala em “islamofobia”, mas essas lideranças não parecem se esforçar para mostrar ao mundo a mensagem de paz que sua religião carrega.
O silêncio de Dilma: que ela não se juntaria aos outros 40 líderes mundiais que andaram de mãos dadas na capital Paris, era de se esperar. Mas nossa presidente só condenou o ataque terrorista após apelos do embaixador da França no Brasil. Até então, Dilma, ou melhor, algum de seus assessores, resumiu o ataque a um breve comentário genérico nas redes sociais. No mínimo estranha essa diplomacia com o Estado Islâmico, talvez por semelhanças como luta armada em prol de um sistema totalitário. E não é a primeira vez.
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