Afrânio Azevedo: o médico que mudou o rosto de Lamarca
qui, 1 de maio de 2014 08:29ALZIRA RIQUIERI – “Se mil guerrilheiros tivesse para operar, mil operaria, se isso significasse lutar contra a ditadura”. Com essa frase, repetida várias vezes, o cirurgião plástico Afrânio Marciliano de Freitas Azevedo marcou sua fala no colóquio, nessa sexta, 25/04, no espaço Armazém Literário, em Uberlândia, com mediação do jornalista Pedro Popó.
Afrânio Azevedo cursou medicina, com especialização em cirurgia plástica, e em 1969, integrava a equipe do Dr. Ivo Pitanguy, amigo e professor do médico. Com formação comunista, herança de seu pai, foi procurado pelo médico ginecologista Almir Ferreira, militante da esquerda, para realizar uma cirurgia plástica em um guerrilheiro cujo rosto estava estampado em todos os jornais do país. Era Carlos Lamarca.
Lamarca era capitão do exército brasileiro, que inconformado com os rumos do país após o golpe de 1964, desertou em 1969, entrando na luta armada, como um dos comandantes da Vanguarda Popular Revolucionária (VPR), organização de extrema-esquerda que combatia o regime. Como atirador de elite do exército, realizou assaltos a bancos para financiar a resistência ao regime, montou um foco guerrilheiro na região do Vale do Ribeira, sul do estado de São Paulo e liderou o grupo que sequestrou o embaixador suíço Giovanni Bucher no Rio de Janeiro, em 1970, em troca da libertação de 70 presos políticos. Expoente da esquerda brasileira, foi condenado pelo regime militar como traidor e desertor e considerado seu principal inimigo.
Com a fisionomia em todos os postes do país, adjetivado de inimigo público número um do país, Lamarca já não podia circular pelas ruas, e a guerrilha decidiu pela mudança do seu rosto. A época, cirurgia plástica era coisa de mulher ou de gay, e Lamarca, um machão convicto, resistiu muito à ideia, mas acabou convencendo-se, sendo treinado pela militante Sônia Lafoz, a imitar trejeitos femininos, travestindo-no cabeleiro Paulo César de Castro. Segundo ela, no dia da internação para a plástica na clinica São João de Deus em Santa Tereza, no Rio de Janeiro, Lamarca vestiu até uma cueca vermelha, coisa inapropriada aos homens da época, não sendo reconhecido por ninguém do hospital.
O Dr. Afrânio Azevedo, retornando da Bahia, onde foi proferir uma palestra, realizou a cirurgia, ao final de uma tarde de julho de 1969, deixando Lamarca até mais bonito: endireitou o nariz, tirou uma ruga profunda na testa e também a papada, além de corrigir as orelhas de abano, tudo dentro da ética médica. Tres anestesistas compareceram para a cirurgia e Afrânio operou com todos. Oito dias após a cirurgia, Lamarca retornou à clinica para retirar o gesso do nariz e os pontos. Graças a cirurgia, Lamarca conseguiu pouco mais de dois anos de vida na guerrilha, vindo a falecer em 17/09/1971. Em fuga, fraco e desnutrido, recebeu uma rajada de balas, em um cerco das forças militares, no interior da Bahia.
O médico tinha consciência do perigo a que se expôs e que algum dia podia ser descoberto. Justo o militante que levou Lamarca à clinica foi preso e torturado, contando aos militares que o chefe tinha feito uma plástica. Daí ao cirurgião foi um pulo, e Dr. Afrânio foi levado pra interrogatório. Na hora da prisão fazia cirurgia em uma senhora, mas os militares esperaram pelo término (uma prisão poética, segundo ele). Ficou 73 dias no DOI-CODI do Rio de Janeiro, dos quais 60 dias na solitária, com dignidade, sem reclamar. Uma cela pequena e fria, sem cobertor ou colchão. O sogro, pai da primeira esposa, era general do exército e lhe conseguiu um kit de sobrevivência: colchonete e um cobertor ralo. Não houve delação, mas tortura e Dr. Afrânio não guarda mágoas.
No julgamento, o argumento de defesa foi que o médico operou um cabelereiro, sem conhecer a sua real identidade. Ivo Pintaguy depôs a seu favor, falando da competência profissional e exemplar ética no caso, resultando na sua absolvição por falta de provas. A amizade e gratidão ao amigo famoso, conserva até hoje. Retornando ao consultório, a clientela aumentou muito com a fama, de duas consultas por dia, passou a atender quinze. Todos queriam operar com o médico que mudou o rosto de Lamarca. Apesar de todo sofrimento, Afrânio Azevedo se orgulha de ter operado Carlos Lamarca: “graças a mim, ele lutou pela democracia por mais dois anos”. Entende que a cirurgia modificou a sua vida e lhe reforçou a noção de dignidade e respeito. Tem o respeito da família e das pessoas que conhecem sua história e acima de tudo, não tem mágoas. Voltando a terra natal, Uberlândia, foi por vinte anos, secretário municipal de educação dos prefeitos Virgilio Galassi, Paulo Ferolla e Odelmo Leão. Na sua gestão, em cinco anos seguidos, Uberlândia recebeu prêmios do MEC de melhor educação do país: “fiz plástica na educação de Uberlândia”. Afirma categórico que o que vai mudar o Brasil é a ampliação da “Cultura do Conhecimento”.
Sem lamentar nada na vida e totalmente responsável pelas suas decisões, Afrânio Azevedo tem que a sociedade sempre tem razão. “Se o caminho escolhido for errado, o próprio povo repensa sua escolha e busca outro caminho”. Foi assim com a ditadura e assim será sempre.
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mais um podre da medicina em favor de assassinos,guerrilheiros e vandalos, devia ter eexercido a medicina em esgotos imundos dos ratos vermelhos comunistas. uma lastima a existencia de tais vermes.
Não sabia da identidade do terrorista/cabelereiro Lamarca. Se você fazia parte de grupos de esquerda….muito estranho! Será que você fumou demais a erva do capeta!!!!!!
Se conhecessem este homem, jamais abririam a boca para berrar tantas asneiras sobre este caso.
Lutou por um ideal que hoje vivemos a “democracia”.Sempre foi um homem de coração ligado ao social. Quando de seu conhecimento, jamais deixou de olhar e lutar pelos mais necessitados.
Digo por experiencia própria, pois tive o prazer de conviver com o mesmo por mais de 35 anos.
Lamento mito muito seu falecimento que acabou de acontecer nesta manhã.
Dr. Afranio, não importa o dizem ou o que pensem sobre seus atos aqui na terra, certo é que Deus está te recebendo para lhe dar a recompensa por tudo que fizeste.
Como sempre me despedia …abçs.
Aham, idiota útil, não é por causa de bandidos do passado que vivemos em democracia. A democracia se fez exatamente por não sermos comandando por comunistas (veja a coreia do norte). Eram Marxistas que não queriam nada além do que implantar uma ditadura mais sanguinária e doentia do que a que tínhamos aqui, um comunismo que matou mais de 200 milhões de pessoas no mundo.