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Reflexões sobre a Justiça, por João Baptista Herkenhoff

ter, 15 de abril de 2014 00:00

* João Baptista Herkenhoff

Cada disciplina jurídica tem um campo específico de abrangência. O Direito Constitucional modela o figurino jurídico do Estado. O Direito Civil fundamenta a vida das pessoas. O Direito do Trabalho cuida da vida laboral. O Direito Penal define crimes e estabelece penas. Diversamente das disciplinas particulares, a vocação dos “Direitos Humanos” é a universalidade. Sua razão de ser é o culto à dignidade da pessoa humana. Pobre formação terá o jurista se conhecer todas as disciplinas particulares e desconhecer a disciplina geral que dá o sentido ético ao seu mister!

O jurista tem uma tarefa na construção da Democracia real, que não se confunde com a democracia de fachada. A Democracia real terá sua gestação no debate, na participação de todos, na escuta das vozes silenciadas pela opressão. O jurista, que optou pela transformação social, deve entrar em relação de comunhão com as classes populares, no rito de um sacerdócio ungido na opção pelos deserdados da lei. Que grande missão colocar seu saber a serviço da causa libertária, em busca de novos institutos jurídicos, novas interpretações que contemplem os que sempre estiveram à margem do sistema legal. Esse sistema, embora sufragando interesses essenciais das classes dominantes, tem de fazer concessões para que suas determinações assumam um caráter de igualdade em certos direitos e deveres (Emir Sader). O jurista que optou pelo lado dos oprimidos dará vida a princípios constitucionais programáticos, recepcionados sem propósito de real vigência. Esse jurista, meio jurista, meio profeta, tentará localizar, com olhos de ver, o espaço em branco dentro do sistema de legalidade, um espaço “que escape ao alçapão da ideológica legalidade que induz à não-mudança, ao imobilismo, à manutenção do status quo” (Luiz Edson Fachin).

Ao lado de advogados como o gaúcho Jacques Alfonsin, que importante papel terá o juiz que esteja a serviço da construção de um novo mundo. Um juiz sem prerrogativas e vantagens pessoais. Carregará nos ombros um fardo, mas o fará com alegria, misto de juiz e poeta, não com o sentido pejorativo que se desse a essa fusão, mas com o verdadeiro sentido que há em ver como atributos da Justiça a construção da Beleza, obra do artista, e a construção do Bem, obra do homem que procura trilhar o caminho da virtude.Diverso e oposto desse paradigma será o juiz distante e equidistante, cuja pena se torna para ele um peso, não por sentir as dores que não suas (Newton Braga), mas pelo enfado de julgar, pela carência da paixão que faria de seu ofício uma aventura existencial.

 * Magistrado aposentado, Livre-Docente da Universidade Federal do Espírito Santo e escritor.
E-mail: jbherkenhoff@uol.com.br
CV Lattes: http://lattes.cnpq.br/2197242784380520

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