Debaixo do pé de limão, por Alzira Riquieri
qui, 24 de abril de 2014 00:00Toda casa tinha um pé de limão. Não desses limões chiques, como o galeguinho e o taiti, mas limão china, como os mineiros dessas bandas conhecem, ou rosa dos paulistas ou capeta, como se fala em Belzonte.
Limão servia pra tudo, não só pra suco ou salada. Além de coalhar leite e temperar carne, limpava tachos e macuco de pé de criança. Aliás, o suco misturado com um pouquinho de bicarbonato, virava guaraná do bom.
Lá na casa da minha mãe também havia um e um banco, onde tudo podia acontecer. De quentar sol da manhã ou pegar a fresca de tarde, desde dormir ou conversar, rezar ou receber visitas nos dias de calor.
Alguns rituais eram feitos à sobra do pé de limão. Fazer crochê, remendar roupas ou tirar piolho dos pequenos, que merece uma nota de rodapé. De manhã, se passava uma pasta de fubá como suco de limão na cabeça do menino, que ia pro sol. Dava uma coceira, pois os piolhos esquentando ficavam bravos. Lavava-se a cabeça e o infestado e a vovó, com um pente fino, tirava os piolhos meio tontos, lá debaixo do pé de limão. O ritual se repetia por uns dias, até que não saísse nenhum filhote do parasita. E a vida ia passando, lenta e cheia de causos, assistidos silenciosamente, pelo pé de limão, que toda casa tinha.
Saint-Exupéry disse que o significado das coisas não está nas coisas em si, mas sim em nossa atitude com relação a elas. Assim é a vida. Às pequenas realidades, podem ser dados significados dependendo do olhar de cada um. Alguns dão significados demais a coisas sem importância ou que não podem mudar e deixam passar esquecidas, as pequenas que colorem e têm sentido na existência.
Pra contar as cotidianidades da vida, vários alunos do curso de Jornalismo da Universidade Federal de Uberlândia se reuniram. O grupo, formado na maioria por aqueles vindos das escolas públicas, com realidades diversas, mas igualmente ricas, sentam-se debaixo do pé de limão de toda casa, e lançam o olhar de simplicidade e leveza, aqui no precioso espaço dos amigos Darli e Zé Vitor. Contam causos e casos de festas, lágrimas, ritmos e risos. Tudo pode ser reinterpretado e virar crônica. Fernando Sabino com o seu “Homem nu” sabia disso.
Além dos causos, mostram pra toda a sociedade não só que jovem gosta de ler e escrever, mas principalmente, que os que vêm das escolas públicas, lêem e escrevem tão bem como os demais e se fazem merecedores do privilégio de estudar em uma boa universidade.
Simplesmente fatos e estórias anônimas, mas não destituídas de belezas e conteúdos, sempre debaixo de um pé de limão.
10 Comentários
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Bela crônica Alzira, parabéns pelo texto e pela inciativa deste espaço tão importante para a formação profissional dos alunos do curso de Jornalismo da UFU.
Parabéns Alzira pelo texto, continue assim.
COMO BOM SAUDOSISTA, ADORO CAUSOS, DE NOSSOS AVÓS, E ME RECORDO COM SAUDADES DESSAS PESSOAS QUE GRANDE IMPORTANCIA TIVERAM NAS NOSSAS VIDAS………VOU COM MUITO PRAZER LER SUAS CRONICAS ASSIM QUE POSTADAS
PARABENS PELA PESSOA ESCOLHIDA E PELO COMPROMETIMENTO
TEM ESTÓRIA VINDO POR AI.
Parabéns Alzira, para você e todo grupo.
Parabéns, Alzira. Sucesso, pra você e todo o grupo, nesse novo projeto.
Alzira,
Na minha casa também tinha um pé de limão……………………..adorei!!!!!!!!!!!!!!
Querida Alzira, parabéns pelo belo texto. Apesar de viver minha infância na capital, pude proporcionar aos meus filhos uma casa em Uberlândia com um lindo pé de limão galego. Alegria de meus filhos e sobrinhos de BH que passavam férias em nossa casa. Aja limonada. Rsrsrs
Parabéns Alzira !!!
Durante a leitura tive a sensação de ouvir sua voz !!!
Muito BOM !!!
PÕ, Sueli. AJA sem H. Que que isso?
Alzira, parabéns!!!
Sinto-me honrada de ter uma irmã com tantos talentos…
Contar estorias nos remete a lembranças e ensinamentos que podemos aproveitar e absorver em nossa vida… Além disto, deleitarmos com “causos” – praticas tao esquecidas em termpos de alta tecnologia e virtualização das convivências!
Como diz nossa sábia mãe Dona Pul – a gente precisa lembrar dos tempos que tinhamos tempo para escutar e contar nossas estorias sentados com nossos vizinhos na calçada. Infelizmente sao época passadas, mas nao podemos perder a poesia e doçura de compartilhar nossas experiencias.
Parabéns!!! Amei….