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Coluna: Furando a Bolha (01/09)

sex, 1 de setembro de 2023 09:24

FURANDO A BOLHA

Seja iluminado, não seja um sugador de almas

Neste feriado de aniversário de Araguari, aproveitei para colocar em dia algumas leituras que estavam atrasadas. Terminei de ler o clássico de Stephen King, “The Shining” (O Iluminado), que foi escrito em 1977 e adaptado para o cinema pelo genial e icônico diretor Stanley Kubrick em 1980.
Assisti ao filme, mas não cheguei a ler o livro “Doctor Sleep” (Doutor Sono), que seria a continuação dos eventos do primeiro livro/filme. Não me aprofundarei em todas essas obras.
Sou apaixonado pelo filme de 1980, não pelo terror ou suspense – longe disso. Inclusive, são gêneros que geralmente abomino, pois não vejo graça na grande maioria das películas que a indústria produz, principalmente aqueles pastelões ou com sustos fáceis. Com exceção de algumas obras de William Peter Blatty e do próprio Stephen King, que utilizam o terror e o suspense como ferramentas para dissecar a psiquê humana. Por esse motivo, resolvi ler o livro, que possui mudanças estruturais significativas na história, em relação à adaptação feita pelo diretor Kubrick. Entretanto, o ponto central que desejo abordar aqui é comum a ambos: os sugadores de almas.
Na primeira obra, King constrói um enredo genial no qual um pai de família leva seu filho, que possui habilidades especiais (é “iluminado”), e sua esposa para passarem uma temporada no Hotel Overlook. Ele ficaria encarregado de cuidar das instalações e manter os caldeirões acesos para que o hotel não congelasse. Jack Torrance, o protagonista, aproveitaria a estada para escrever seu sonhado livro.
No decorrer da trama, o hotel parece ganhar vida e revela-se um verdadeiro sugador e devorador de almas. Isso colabora para que Jack perca sua sanidade. O interessante é perceber como o isolamento – algo que muitos experimentaram durante a pandemia – pode, aos poucos, dilacerar a mente humana, deixando as pessoas à flor da pele e, frequentemente, paranoicas, com graves distúrbios psicológicos.
O que realmente se destaca nessa obra é a maneira como o autor aborda um fenômeno que ocorre em nossas vidas: pessoas, coisas ou situações que acabam sugando nossa alma, vitalidade, esperança e sanidade. São como sanguessugas que crescem, principalmente nos momentos mais sombrios, e buscam incansavelmente aqueles que irradiam luz.
Na continuação, King desenvolve a ideia do sugador de almas de maneira ainda mais explícita e sinistra. E embora eu não tenha lido o segundo livro, as reflexões que ele apresenta têm ressonância em muitos aspectos de nossas vidas.
Nosso mundo não é composto apenas de pessoas iluminadas e sugadores de almas. Na realidade, ao longo da vida, todos nós podemos nos tornar um ou outro, dependendo das nossas escolhas. O autoconhecimento é uma ferramenta poderosa para evitar a transformação em um vampiro emocional.
Um dos personagens mentores do garoto Danny expressa uma frase extremamente significativa que destaco aqui: “As coisas mais sombrias são as mais famintas e consomem o que é iluminado”. Observe em sua vida cotidiana aquelas pessoas que possuem uma certa luz, seja por se destacarem no trabalho, serem queridas por alguma razão, serem competentes ou possuírem um valor admirável. Quase sempre, aparecerá alguém que desejará apagar essa luz ou, de alguma forma, tentará sugá-la até que se extinga.
O sanguessuga emocional é egoísta, coloca sempre suas próprias prioridades em primeiro lugar, sem se importar com as consequências. Lhe falta empatia e alteridade. Ele é manipulador, adora se fazer de vítima e utiliza sentimentos como pena para alcançar seus objetivos. Fica claro que ele possui problemas sérios de dependência emocional, além de frequentemente carecer de responsabilidades.
Como mencionei antes, em algum ponto da vida, podemos ser iluminados ou sanguessugas. As escolhas que fazemos determinarão nosso caminho. Se estivermos em um ambiente tóxico (como o Overlook Hotel), onde frequentemente nos sentimos sem energia, perceberemos que nossa luz está se apagando e que, a cada dia, nos tornamos mais críticos, impiedosos, julgadores e intolerantes, devemos acender o sinal de alerta.
Sendo assim, estimado leitor, talvez se pergunte como lidar com esse tipo de pessoa. Após ler e estudar muito esse fenômeno, apresentarei algumas sugestões. É importante reconhecer os padrões, pois esse perfilpoderá ser qualquer um, inclusive você, sua mãe, seu pai, seu irmão, um amigo ou qualquer pessoa que lhe é presto. Ao perceber esses comportamentos, estabeleça limites claros. Tenha muito cuidado com quem compartilha sua vida, pois é isso que o sugador utiliza como alimento. Se você compartilhar coisas boas, a vontade dele de sugar sua luz será ainda maior. Aprenda a dizer não. Dessa forma, estabelecerá barreiras e manterá o controle sobre suas escolhas
A vida é demasiadamente curta para tentarmos apagar a luz dos outros. A inveja, um sentimento frequente nesse contexto psicológico, é como um câncer que corrói gradualmente as entranhas. O parasita emocional se acomoda em um padrão que, apesar de sua constante sucção, faz com que sua energia vital e o seu propósito se esvazie. Ele transfere seus valores, crenças e desejos para outrem e sobrevive com migalhas até que, mais cedo ou mais tarde, se esgote.
Para concluir essa reflexão, uma passagem do livro de Stephen King, “The Shining”, reflete esse raciocínio: “Monstros são reais, e fantasmas também. Eles vivem dentro de nós, e às vezes, eles vencem.”¹ Não permita que esse monstro vença. Fique atento e cuide de si mesmo e de quem você ama, não deixe-se ser sugado, pois uma hora, estará tão fraco que dificilmente conseguirá se libertar. ILUMINE-SE!

 

1) “Monsters are real, and ghosts are real too. They live inside us, and sometimes, they win.”

Leandro Alves de Melo, bacharel em Direito pela UFU, advogado, colunista, é sócio proprietário dos escritórios Alves & Melo Advocacia MG e GO, pós-graduado em gestão de pessoas INESP/SP (2018-2020), especialista em Direito Previdenciário pelo IEPREV/BH (2020 a 2022), pós-graduado em Direito Constitucional pelo Instituto de Direito Público de Brasília (2019-2022), vencedor do Top of Mind 2023: advogado previdenciário.

2 Comentários

  1. Eliane disse:

    Já ouvi muito isso, pessoas que tentaram desanimar e desencorajar grandes artistas de seguirem seus sonhos.

  2. Sônia Bertolazzi disse:

    Vim ler esta coluna por indicação de uma amiga. Fiquei impactada com o texto, apesar de não ter assistido o filme me identifiquei e enxerguei situações da minha vida que se assemelha a descrição. Parabéns ao colunista por fazer um texto tão coeso e que mexe de maneira positiva com a nossa cabeça. Acompanharei sempre agora.

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