Ficha Técnica – Passeio ciclístico na lua
qua, 8 de fevereiro de 2017 05:18“A expectativa é um prato que se come frio, pense bem antes de alimentá-la”. A frase ventilada naquela tarde fez-me até perder de vista os trocados gastos com o aumento da tarifa de ônibus. Uma virada histórica, um gol nos acréscimos, mais uma reviravolta. Numa fração de segundos, o mundo graúdo e sem porteira vira do avesso e alguém perde o chão. Desgosto que droga alguma cura. Ao pé da ribanceira, outros tantos sofrem de indigestão. Entre encantos e desencantos engolidos pelo tempo, o melhor roteiro é deixado ao acaso.
Poucas batalhas fascinam-me como aquelas guerreadas contra o tempo. Numa hora o maior aliado, em outra o pior inimigo, como aprendeu a Argentina de Tévez e cia na final da Copa América de 2004. A voz de Galvão Bueno traduzia a tristeza dos brasileiros com a derrota. Eis que no último lance, Adriano tratou a bola com destreza e deu-lhe rumo para o fundo das redes, levando aos pênaltis. Aprendizado como o Bayern de Oliver Kahn na primavera de 1999. Os alemães engatilhavam o grito de campeão da Europa, quando nos acréscimos o Manchester United fez do impossível realidade aos olhos de 90 mil. Dois gols e o título europeu para os ingleses.
Na final da Taça Brasil de 1966, o destino foi o caminho oposto ao que trilhavam em apostas e prognósticos milimetricamente calculados. Para muitos, chegar na final do torneio contra o Santos de Gilmar, Pepe, Zito e Pelé era a vitória para o Cruzeiro. Muito menos do que esperavam os 77 mil no Mineirão. Ao fim do primeiro tempo, o rei do futebol acenava com os cinco dedos para a torcida em alusão aos títulos conquistados pela equipe santista. O que os cruzeirenses viam era somente o número no placar. Em 45 minutos, 5 a 0 para o time de Raul, Piazza, Tostão e Dirceu Lopes. O jogo terminou 6 a 2, e o tempo pregou suas peças mais uma vez.
Tempo que também ensina como Galileu Galilei. O mundo dá voltas, como deu na vida do zagueiro Matip, da seleção de Camarões. No início do ano, ele se negou a disputar a Copa da África alegando que gostaria de faturar um título nesta temporada, e acreditava mais na possibilidade pelo Liverpool no Campeonato Inglês. Um mês depois, a equipe inglesa quase não briga mais pelo torneio na Terra da Rainha, enquanto os camaroneses acabam de ser campeões continentais.
Na última semana, foi a vez do inesperado pedir passagem na terra do tio Sam. A maior virada de todos os tempos no futebol americano. Venceu quem manteve os pés no chão. Do outro lado, resta o universo em desencanto. Um inferno astral que pode fazer de qualquer um seu hospedeiro. Quando alguém enxerga a necessidade de ostentar a superioridade às expensas do demais, saiba que a real felicidade está naquilo que ainda não se pode ver. Dispense jogos vencidos e tempos perdidos. Acredite nas brechas do caminho, e descobrirá a plenitude do improvável, feito um passeio ciclístico na lua.
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