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Coluna para Nelson Motta

qua, 5 de novembro de 2014 00:01

Abertura meio desligado
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Nas noites que passava assistindo TV e torcendo para começar logo a “Coluna de Nelson Motta” no Jornal da Globo, mal sabia quem era ele. Nada que me impedisse de admirar a maneira fluida e elegante com que ele tratava todo tipo de estilo musical, seja punk, pop, MPB e até aqueles jazzistas que ainda continuam parecendo grego para mim. Era como se ele estivesse ali, sentado no sofá ao meu lado, tornando o assunto acessível, fácil de compreender, com observações pontuais, certeiras, por vezes poéticas. Cada coluna dele é e continua sendo uma aula para mim, num de meus telejornais preferidos (sim, Jornal da Globo, da “mídia golpista” mimimi).

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Jornalista, escritor, produtor musical, compositor, figura ativa nos momentos mais importantes da história da música brasileira. O termo “tropicalista”, que batizou o famoso movimento, surgiu do título de uma coluna escrita por ele. Uniu artistas, produziu Elis Regina, estava com os caras da Bossa Nova, estava com Tim Maia, escreveu a belíssima “Como Uma Onda” com Lulu Santos, teve papel importante no início da carreira de Marisa Monte. A lista não acaba. Nelson Motta acompanhou a carreira de muita gente. Completou 70 anos na quarta-feira passada, 29, comemorando a data com o lançamento de um livro cheio de boas histórias que viveu, além de um CD com letras dele interpretadas por outros cantores.

Depois que fiquei conhecendo melhor a atuação de Motta na música, mal sabia que ele também falava de política em sua coluna no jornal O Globo. Recentemente, uma entrevista que concedeu a Juca Kfouri fez minha admiração crescer ainda mais. Kfouri pergunta a ele, dizendo num tom de brincadeira que aquela era uma “armadilha”: “você virou um cara ‘de direita’, Nelson Motta?”

Kfouri não esperava uma resposta certeira e ao mesmo tempo tão simpática. “De maneira nenhuma,” afirmou Motta. “(…) fui de esquerda, era impossível não ser de esquerda durante a ditadura,” complementou. A seguir, mencionou os fracassos socialistas que o fizeram abandonar seu posicionamento, como a dissolução da URSS, a queda do muro de Berlin, o socialismo falido em países do Leste Europeu, e por fim e não menos importante, o período de nove anos em que viveu nos EUA. Ali, “no coração da besta”, como ele mesmo brincou. Ele também mencionou o brilhante Paulo Francis, que de trotskista na juventude se aproximou na idade adulta do neoliberalismo. O jornalista teria dito a ele quando soube de sua mudança para os EUA: “que ótimo que você vai morar aqui, agora você vai perder suas últimas ilusões,” aos risos.

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Nelson Motta prosseguiu: “Eu vi a lógica implacável que tem ali (nos Estados Unidos). E não depende de vontade política, nem de mobilização popular, nem de conscientização das massas, justiça social… abstrações, praticamente.” Se antigamente os comunistas eram os “comedores de criancinhas”, hoje em dia essa aura maligna paira sobre os direitistas, algo muito bem pontuado por ele durante a entrevista.

“(…) Eu não acho que o ser humano nasceu para ser massa de manobra de utopia nenhuma. (…) A esquerda acha que por uma causa nobre você pode sair atropelando, roubando, matando. Eu não acredito nisso. Se quiser me chamar de direita por isso, eu até aceito,” concluindo seu raciocínio com maestria.

Em tempos sombrios onde argumentos e fatos são respondidos com insultos, mentiras ou qualquer coisa sem nexo que venha à mente, onde quem faz oposição ao governo (atitude extremamente saudável para a manutenção da democracia) é automaticamente taxado de odiador de pobres, racista, machista, “a favor da ditadura militar” e “direitista”, Motta desconstrói essa noção equivocada de direita como uma espécie de acusação, algo que infelizmente é epidêmico no Brasil. Ele também expressa sua indignação com o atual governo em sua coluna. Se minha recusa a abaixar a cabeça para a hipocrisia petista, que abusa da mentira para se manter no poder e apoia ditaduras de esquerda me torna direitista, por favor, me chame de direita.

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