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Segurança na F1

qui, 23 de outubro de 2014 00:01

Abertura Treino Livre
Alô amigos, às vésperas do GP dos Estados Unidos a discussão sobre a segurança na Fórmula 1 continua mais acesa do que nunca, consequência direta do acidente de Jules Bianchi, por isso tentaremos colocar em pauta uma discussão sobre o assunto e o que está sendo feito para salvaguardar pilotos, fiscais, e todos os envolvidos diretamente nas pistas.

Os últimos acidentes que resultaram em morte na F1 aconteceram a exatos 20 anos, no chamado final de semana negro em Imola, onde nos treinos tivemos um gravíssimo acidente com Rubens Barrichello na sexta- feira; o acidente fatal de Roland Ratzenberger; e a tragédia culminou com a morte de Ayrton Senna na corrida. De lá para cá muito se mudou em termos de segurança na categoria, sendo a prova disso os acidentes de Massa na Hungria e o de Jules Bianchi ocorrido no GP do Japão, que segundo médicos especialistas no esporte automotor, não teriam sobrevivido sem modificações feitas nestes últimos anos.

A forma como o acidente de Bianchi aconteceu foi explicada, o carro aquaplanou e em 0,8s o carro desacelerou de 203 km/h para 0 km/h, submetendo o corpo de Bianchi a uma desaceleração de impressionantes 92g. Para uma simples comparação, é como se pegasse um peso de 1kg e acelerasse até o mesmo atingir o peso de 92kg, ou seja o peso de uma pessoa adulta. Isso, ainda segundo os especialistas, causou uma LAD – lesão axonal difusa. E o que é esse tipo de lesão? Segundo explicações, o cérebro é como uma gelatina, esta quando balançada de forma mais forte se parte surgindo micro fraturas. Tal coisa se dá também com o cérebro, causando micro hemorragias e surgindo um inchaço que devido à rigidez da caixa craniana tem que ser aliviado, senão aparece o coma seguido de morte.

Pois bem, toda esta introdução para entendermos onde está a falha de segurança que ocasionou o acidente. Por definição um acidente não é um fato isolado, mas uma sequência de pequenos eventos que culmina em um evento de maior gravidade. Isso é demonstrado de forma clara nas investigações de acidentes aéreos.

Lendo uma matéria veiculada na revista online WarmUp (http://revista.warmup.com.br/edicoes/54/carro-chefe-o-medo-de-volta-a-f1.shtml) chamou minha atenção a discussão sobre a participação direta dos pilotos nessa cadeia de eventos, e o que mais me deixou estarrecido foi a declaração do médico Gary Hartstein, ex-médico chefe da F1, sobre o acidente ocorrido com Alonso no Gp do Brasil de 2003. O Briatore ligou, e o Alonso falou com todas as letras: ‘continuei acelerando porque eu sabia que ia ser curto o tempo de safety-car, para chegar no Fisichella e ganhar na relargada’. Esse é o maior exemplo de que eles não respeitam bandeira amarela coisa nenhuma. Eu trabalho em pista e vejo que eles não tiram [o pé]”. Ora não adiantam medidas de segurança se os próprios pilotos, considerados a elite do automobilismo, não respeitam limites em busca de uma competitividade exacerbada, procurando vencer a qualquer preço. Alonso não infringiu qualquer regra do regulamento, mas pagou um preço razoável por sua “imprudência”: machucou a perna. No acidente Jules, embora ele tenha diminuído a velocidade, não foi suficiente para evitar a aquaplanagem e a consequente batida no trator.

Só para constar no filme de 1966 Grand Prix, obra prima de John Frankenheimer, o personagem Jean Pierre, vivido por Ives Montand, trava um diálogo com sua amante que retrata bem a situação de Alonso. Questionado sobre os acidentes, diz o seguinte (não me lembro exatamente do diálogo, mas é mais ou menos assim): “quando vejo um acidente na pista piso mais fundo [no acelerador], pois sei que todo mundo tira o pé [do acelerador]”. Ao que a personagem com quem dialoga retruca: “mas isso é uma forma horrível de vencer”, e ele finaliza: “não existe forma horrível de vencer, você apenas vence”.

Assim as discussões de segurança que visam melhorar a chamada segurança passiva, aquela que é feita no carro, de nada valerão, pois se a forma de pilotagem agressiva, que faz dos pilotos da F1 a crème de la crème do automobilismo, não for contida nas situações de bandeira amarela, nenhum mecanismo de segurança será efetivo e o protegerá por melhor que seja.

As lições do acidente de Jules, que continua em coma e sem qualquer boletim médico que indique melhoras, ainda estão por serem aprendidas e apreendidas, principalmente pelos próprios pilotos, que podem sim minimizar os riscos da profissão, afinal de contas o risco do acidente, de uma saída de pista, faz parte do espetáculo, e emoção de ver um piloto, para citar apenas um, como Lewis Hamilton, segurar um carro a mais de 300 km/ em uma curva, mesmo saindo para a área de escape é de arrepiar qualquer um.

O erro faz parte do show, a morte não…

Até a semana que vem…

* Advogado, fã da Fórmula 1 desde 1970, e apaixonado pela Ferrari

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