Meio Desligado – O polêmico samba-enredo da Imperatriz Leopoldinense
qua, 11 de janeiro de 2017 05:05O mundo não é um mar de rosas, nunca foi e nunca será. É tão óbvio, mas é tão chato ter que voltar aqui, caros leitores, e dizer praticamente as mesmas coisas em quase todas as colunas. Até peço desculpas para alguns se esse exercício repetitivo nem sempre corresponder às expectativas, mas vamos lá. O tema de hoje foi sugerido por uma pessoa que admiro bastante.
A autocrítica é um animal em extinção, mas mesmo vivendo na era do ressentimento, é possível perceber que os tempos estão mudando. E como a maioria da sociedade não anda aguentando mais desaforo calada, o setor agropecuário manifestou sua indignação com o samba enredo da escola Imperatriz Leopoldinense para o Carnaval 2017. Teoricamente, a escola levanta a bandeira da luta indígena contra o desmatamento e a perda de terras. Na prática, uma das alas se chamará “fazendeiros e seus agrotóxicos”, outra foi denominada de “pragas e doenças” e uma terceira recebeu o nome de “a chegada dos invasores”, sobre o descobrimento do Brasil. Haverá também uma ala chamada “os olhos da cobiça”.
O setor agro é chamado de “o belo monstro”, que no samba-enredo “sangra o coração do meu Brasil, (…) rouba as terras dos seus filhos, devora as matas e seca os rios. Tanta riqueza que a cobiça destruiu”.
Como diriam os personagens do excelente filme “Cine Holliúdy”, a Associação Brasileira dos Criadores de Zebu (ABCZ) publicou uma nota que é uma verdadeira “voadora na pleura”. Aqui vai um trecho:
“Antes de mais nada, é preciso esclarecer e reforçar que o país do samba é sustentado pela pecuária e pela agricultura. Chamados de “monstros” pela escola, nós, produtores rurais, respondemos 22% do PIB Nacional e, historicamente, salvamos o Brasil em termos de geração de renda e empregos. (…) Inaceitável que a maior festa popular brasileira, que tem a admiração e o respeito da nossa classe, seja palco para um show de sensacionalismo e ataques infundados pela Escola Imperatriz Leopoldinense. O setor produtivo e a sociedade não podem ficar calados diante a essa injustiça. É preciso que o Brasil e os brasileiros não só enxerguem e reconheçam a importância do nosso setor, como se orgulhem dessa nossa vocação de alimentar o mundo.”
Isso que está acontecendo com o agro acontece com empresários, com industriais. O setor produtivo no geral é sempre tachado de vilão, enquanto o Estado, esse mesmo, que nos impõe uma carga tributária desumana, nunca é colocado em xeque. São tantos clichês… a começar pelo mito do bom selvagem, daquele índio bonzinho e coitado que foi explorado pelo português malvado. Hoje sabemos que as tribos desejavam exterminar seus rivais e algumas até se aliaram aos portugueses para isso. O império asteca, por exemplo, oprimiu outras tribos que por ali viviam. Ou seja, esse maniqueísmo de “bom” e “mau” só existe nas fábulas.
O mimimi com o agronegócio já encheu o saco. É duro de aceitar, mas o estado natural do ser humano é a escassez. É muito fácil aceitar os benefícios e criticar os prejuízos como se não fossem indissociáveis. A vida em sociedade, de esgoto encanado, água saindo da torneira, eletrodomésticos e gôndolas de supermercado com uma imensa variedade de alimentos cobra um preço.
A natureza está sendo desmatada e contaminada? Está. É preciso buscar alternativas sustentáveis? Sim. Mas me parece razoável entender que, não importa o esforço empregado nesta dura tarefa, é impossível garantir o bem-estar dos 7 bilhões de seres humanos que vivem no mundo. Nada contra os vegetarianos, e defensores dos alimentos orgânicos. As plantações de soja são menos agressivas à natureza do que os gases dos bovinos, proporcionalmente falando. Mas é bom ter consciência de que esse tipo de produção e de estilo de vida é inviável em larga escala.
E se você se alimentou hoje, agradeça a um produtor rural.
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