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Ficha Técnica – Apenas mais uma vítima

qua, 22 de junho de 2016 05:30

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Juma. Espécie em extinção desde 2003. Encontrada ferida após perder a mãe na infância. Cresceu no Centro de Instrução de Guerra na Selva. Permaneceu quase 20 anos em cativeiro, entre flashes, selfies, desfiles e afins. Certo dia, cansou-se de ser troféu. Acorrentada durante o Revezamento da Tocha Olímpica, exibida para o mundo como um mascote. Depois da solenidade, uma jaula adaptada em uma caminhonete lhe esperava. Atrevida, tentou fugir e, ao avançar sobre um soldado, bang! Não bastava tranquilizantes. Foi abatida com um tiro de pistola.

Não dissemino a culpa pelo Exército, tampouco na organização do evento olímpico. Mas também não creio que a morte do terceiro maior felino do mundo na capital amazonense seja algo trágico para ambos. O cerne da questão é como conseguimos banalizar um dos momentos mais simbólicos do esporte e zombar de nossos próprios recursos em praça pública. Da onça pintada ao elefante branco em Manaus. Do Rio Doce à Baía de Guanabara.

Última foto de Juma, exibida em cerimônia de Revezamento da Tocha Olímpica (Créditos Jair Araújo)

Última foto de Juma, exibida em cerimônia de Revezamento da Tocha Olímpica (Créditos Jair Araújo)

 

Outro dia, ouvi de um senhor que voltamos à cultura do ame-o ou deixo-o. Entre um gingado e outro no ônibus, assustei ao raciocinar o que acabava de me deparar. Brasil. Médici. Slogan ufanista. Anos de chumbo. Ditadura Militar. Não era para tanto. Se realmente pensássemos em cuidar do lugar de onde vivemos, das urnas ao prato de comida no jantar, nosso vizinho não seria despejado amanhã de manhã. Mas vida que segue. Talvez a revolta daquele rapaz fosse mesmo é com a Seleção.

O Circo Brasileiro de Futebol parece andar de bem com a torcida. Despachou Dunga, abrigou Tite. Finalmente, teremos um técnico que conquistou por mérito aquele cargo. Mesmo assim, a sombra do trio de ferro ainda paira sobre todos. Preso Marin, o ex-viajante Del Nero e Coronel Nunes não largam o osso. Certamente continuarão irredutíveis, sem olhar para a maior parte do patrimônio nacional que tem nas mãos (leia-se: bolso). Se bobear, estão compondo mais uma versão de “Pra Frente Brasil!”

Ontem fez 14 anos que vi Brasil e Inglaterra pelas quartas da Copa do Mundo. Naquela madrugada de 21 de junho, a canhota de Rivaldo e a magia de Ronaldinho pediam passagem. Uma lição para os inventores do futebol. Época de glórias. Ao testemunhar tamanhas trapalhadas nas últimas semanas – humanos tratados como bichos e animais como fantoches – senti saudade. Daquela noite. Daquela seleção. Daquele país que caminhava melhor. E do seu Valdivino que me acompanhava na torcida. Certamente, ele diria – “Juma foi apenas mais uma vítima”.

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