Colesterol
sex, 27 de junho de 2014 00:00
1 – Com que idade as pessoas devem começar a medir os níveis de colesterol?
Existem duas situaçoes. Pessoas sadias sem nenhuma alteração precedente nem história familiar da doença, sem parentes que tenham implantado pontes de safena, feito angioplastia ou sofrido infarto, por exemplo, devem medir os níveis basais de colesterol aos 35, 40 anos. No entanto, o grupo de pessoas com história familiar de doença aterosclerótica (enquadram-se nesse caso os infartados que foram operados e aqueles que fizeram angioplastia) precisam de análise muito mais precoce, entre os 15 e os 20 anos. Em subgrupos, que são pequenos, com alterações genéticas dos elementos que contribuem para a elevação do colesterol do plasma – o mais importante é a hipercolesterolemia familiar -, a dosagem tem que ser feita ainda na infância.
Precisa ser lembrado que a alteração do colesterol no plasma isoladamente não causa sintomas. A manifestação clínica só aparece quando há obstrução de alguma artéria no coração ou nos membros inferiores, por exemplo. Portanto, a medida dos valores plasmáticos do colesterol deve ser feita como rotina e não porque houve a manifestação de um sintoma qualquer.
2 – Há 40, 50 anos, a questão do colesterol era simples. Considerava-se colesterol elevado acima de 240; de 200 a 240 era normal e menos de 200, baixo. Depois foram descritas as frações do colesterol e surgiram os conceitos de HDL, o bom colesterol, e de LDL, o colesterol ruim. O que significa colesterol bom e ruim e o que é desejável nos níveis dessas frações?
As primeiras documentações experimentais de que o colesterol aumentado causava doença foram feitas na Rússia, entre 1908 e 1913. Os russos provaram que dieta rica em colesterol causava aterosclerose. No entanto, foi só depois de o artigo escrito pelo russo Anitschkow, que provocou aterosclerose em coelhos alimentando-os com colesterol, ser publicado numa revista americana, que o assunto despertou a atenção da Associação Americana do Coração.
Logo a seguir, teve início o famoso estudo de Fremingham, uma cidadezinha nos Estados Unidos cuja população tem sido investigada desde então para acompanhar a evolução da doença no que diz respeito aos fatores de risco para aterosclerose, entre eles o colesterol.
Hoje se sabe que o colesterol total é composto pelo menos por duas frações: o HDL (High DensityLevel), o colesterol de densidade alta e o LDL (LowDensityLevel). O HDL é o colesterol protetor, quer dizer, seus índices elevados se associam a mais baixa incidência de doenças cardiovasculares. Isso se aplica, por exemplo, às mulheres. Na pré-menopausa, é comum elas apresentarem níveis de 50 a 100 de HDL, valores que não se encontram nos homens.
3 – Às vezes, o valor de colesterol total está elevado porque os de HDL estão altos?
A medida isolada do colesterol total pode enganar. É preciso considerar as frações. À proporção que os estudos epidemiológicos foram sendo feitos, os conceitos foram se ajustando aos achados que mostraram ser o LDL aumentado causa importante de doença coronária. Se não houver nenhum outro fator de risco, LDL até 130mg/dl é tolerável. Se a pessoa, porém, teve um evento como um infarto, foi operada ou fez angioplastia, o LDL deve ficar abaixo de 100. O mesmo critério se aplica, quando simultaneamente ocorrem dois ou mais fatores de risco (tabagismo, hipertensão, diabetes etc.) que também não podem deixar de ser controlados.
4 – É importante gravar esse número. Se a pessoa não tem fator de risco nenhum, não fuma, não é diabético, nem hipertenso ou sedentário, não tem história familiar da doença, LDL até 130 é aceitável?
Se a pessoa manifestou eventos como infarto, AVC, derrame cerebral, cirurgia de revascularização, angioplastia ou fez coronariografia que demonstra a presença de lesão, o LDL precisa ficar abaixo de 130. Entretanto, se existem fatores de risco associados como diabetes, hipertensão e fumo, deve ficar abaixo de 100, porém preparem-se, mudanças com novos valores virão por aí.
5 – Acima de 130 não é aceitável?
Acima de 130 é um sinal amarelo que merece consideração. Em geral, entre 130 e 160, preconiza-se dieta, não necessariamente acompanhada de remédio.
6 – Em relação ao HDL, quais os valores desejáveis?
Vários estudos na literatura mostram que HDL elevado protege e baixo constitui fator de risco. No laboratório do Incor, há trabalhos demonstrando que no homem HDL abaixo de 40 associa-se a uma evolução pior entre os doentes submetidos à cirurgia de revascularização miocádica.
Um grupo de pacientes (a média de HDL era ao redor de 30 nesse grupo) que analisamos por quase seis anos indicou claramente que eles estão sujeitos a maior mortalidade. Diante desse dado, tentamos descobrir por que isso acontece e analisamos a função endotelial (lembrando que endotélio é uma camada celular que reveste internamente os vasos). Pudemos demonstrar, então, que pessoas com HDL baixo têm disfunção endotelial, ou seja, os vasos têm capacidade de dilatação menor. E mais: HDL baixo e LDL aumentado indicam que estamos lidando com dois importantes fatores de risco.
7 – HDL baixo é fator de risco isolado?
HDL baixo isoladamente é fator de risco. Em trabalho recente realizado no Incor, analisamos a relação triglicérides e HDL, uma vez que triglicérides isolado também é fator de risco. O estudo mostrou que, quando essa relação está aumentada, ou seja, triglicérides aumentados ou HDL baixo, não só a manifestação da doença coronária é 5 ou 6 anos mais precoce do que nas pessoas em que essa relação é normal, como a ocorrência de infarto também é muito mais precoce.
Essas conclusões nada têm a ver com LDL. Estamos lidando agora com o HDL e insistindo que, em níveis baixos, ele é um fator de risco importante. Estamos demonstrando, ainda, que é possível corrigir o HDL baixo de três maneiras: não fumando, fazendo exercícios físicos e tomando um remédio, a niacina, que aumenta os níveis de HDL e corrige a disfunção endotelial mencionada anteriormente.
Por isso, repetimos, a avaliação do colesterol total e de suas frações é muito importante para estabelecer prognóstico.
8 – Se aparece paciente com o HDL baixo e o LDL elevado, ou as duas coisas simultaneamente, o que deve ser pior, a recomendação é mudar o estilo de vida. Que impacto tem essa mudança na correção dos níveis de colesterol?
Essa é uma pergunta prática e muito importante. O primeiro passo é analisar os níveis do colesterol e o conjunto de fatores de risco a que a pessoa está exposta. Se a alteração de LDL for de discreta a moderada, a orientação mais correta é avaliar a parte dietética e tentar adequá-la. Para tanto, é preciso fazer uma investigação precisa dos hábitos alimentares do paciente. Se perguntarmos “o senhor come carne?” e ele responder que não, mas que come queijo, e bastante, o problema continua o mesmo e deve-se tentar corrigir esse desvio. No entanto, mesmo que novos hábitos sejam adotados e a dieta seja seguida à risca, quanto ele consegue reduzir no total? Pouco, de 15% a 20%, não mais que isso. Imagine, então, que o LDL seja 200. Depois de enorme esforço, cairá para 160, 170, mas a pessoa continuará em risco.
Portanto, se o nível estiver de fato aumentado, é fundamental fazer duas coisas: indicar medicamentos e corrigir a dieta. Às vezes, o médico dá o remédio, mas o doente não faz dieta. Não adianta nada. Está gastando dinheiro à toa. Ele tem que fazer as duas coisas ao mesmo tempo, porque estamos falando de um problema a longo prazo, não de um episódio como uma pneumonia ou uma gripe que se trata e a doença acaba. Não, a alteração associada à aterosclerose, no caso o colesterol, é uma doença metabólica que nunca mais desaparece. Por isso, é importante falar a respeito da mudança do estilo de vida porque determinados comportamentos jamais poderão ser abandonados.
No que se refere ao uso de medicação, há casos em que ela é absolutamente necessária, pois a dieta reduz pouco os valores do colesterol. Terapêuticas existem e muitas. Há drogas muito eficientes e bem toleradas que atuam sobre a formação enzimática do colesterol no fígado. São as estatinas. Outras atuam sobre a absorção do colesterol no intestino. Existe ainda a colesteramina, uma droga mais antiga, e atualmente apareceu uma nova que também é muito boa. Todas elas permitem combinações que podem ser utilizadas para reduzir o LDL de forma eficiente.
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