A nós, que somos jovens
qua, 17 de setembro de 2014 00:01
Quero falar das coisas que aprendi nos discos depois do que aconteceu comigo. Sempre que costumava ouvir “Como Nossos Pais” (composição de Belchior eternizada na voz de Elis Regina) ficava pensando na letra de um jeito bem simplório, reduzida ao contexto da ditadura militar. Mas como o óbvio nem sempre é tão óbvio assim, precisei de mais alguns anos para finalmente compreender o trecho que considero o principal dessa canção:
“Hoje eu sei
Que quem me deu a idéia
De uma nova consciência
E juventude
Tá em casa
Guardado por Deus
Contando vil metal”
Chego como quem parece uma senhora sábia, do alto dos meus vinte e poucos anos. Longe disso, bem longe. Mas já percebi que viver é uma tarefa complicada. E fica ainda mais difícil quando, por algum descuido, mesmo que cheios de boas intenções, assumimos uma mentira como verdade e criamos com base nela um princípio motor de nossas ações e pensamentos.
É natural do ser humano questionar, duvidar, buscar conhecimento, inconformar-se com a miséria, violência e tudo mais que há de errado no mundo. São tantos “porquês”, dentro e fora da gente, nesses momentos tudo o que queremos são respostas satisfatórias. E pode ter certeza, o que não falta é gente escondida atrás de ideologias querendo te dar essas respostas e te mostrar o “verdadeiro” culpado para os problemas do mundo. “Por isso cuidado meu bem, há perigo na esquina”.
Eles te dão muitos inimigos. E como ser jovem é ter essa ânsia e ímpeto inerentes da idade, iniciamos nossa cruzada para combatê-los, sem pestanejar. Lá vamos nós salvar o mundo. Aprendemos com nossos professores de filosofia e história que os vilões são o capitalismo, os EUA, os ricos e brancos, a privatização, a mídia, a polícia, os militares, a Veja, a Folha.
E no meio desse turbilhão de informações simplistas, maniqueístas e falaciosas, passamos a odiar os inimigos que eles criaram, quando na verdade nem sabemos direito o que é capitalismo e privatização. Mal conseguimos balbuciar algumas palavras sobre economia. Passamos a nos informar apenas por meio de blogs e revistas com idéias iguais às nossas, afinal, ignoramos e negamos tudo o que vem da “grande mídia golpista”. Esse jeito de ver o mundo também é uma alienação. Não pense que idéias revolucionárias fazem de você alguém melhor do que aquele seu vizinho que curte ouvir um funk no último volume. Suas ações determinam quem você é; não o que você diz.
A realidade não pode ser explicada como algo “preto ou branco”. Ela parece mais um quebra cabeça faltando um monte de peças impossíveis de achar ou uma teia assimétrica feita por alguma aranha maluca e bêbada. Nossos esforços para tentar compreendê-la devem sempre levar em conta a complexidade de tudo o que nos cerca.
Ao aceitarmos os inimigos que eles nos deram, eles, que pareciam revolucionários e intelectuais, se enriquecem e vivem confortáveis, enquanto nós perdemos a capacidade de raciocinar. Paramos de nos questionar, perdemos a humildade de reconhecer quando estamos enganados. Essa é a grande lição que aprendi com a música “Como Nossos Pais”. Não existe fórmula mágica para salvar o mundo. Errar também é natural do ser humano, ainda mais a gente, que é jovem e tem a vida toda pela frente.
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Talita você está de parabéns. Muito boa sua coluna e principalmente o texto acima.