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Coluna: Direito e Justiça (19/05)

qui, 19 de maio de 2022 08:12

Direito e Justiça:

Pinga – Fogo:

Curtas e grossas:
– Bovinos e eqüinos fazem da cidade um curral a céu aberto.
– O nosso comércio precisa renovar-se e ter mais competitividade.
– Podemos dizer adeus aos sonhados quarteirões fechados da Rua Rui Barbosa.
– A SAE estraga todos os recapeamentos feitos com tanta dificuldade e demora.
– Somos a cidade das praças ocupadas por construções que nada têm a ver com elas.
– Os ínclitos vereadores pretendem aumentar suas chances eleitorais com mais 2 vagas.
– Estou para ver um político que, depois de eleito, pense realmente no povo e não em si.
– Sinais de trânsito, onde não precisa; onde precisa, não há; Pululam os quebra-molas.
– Casas e casarões tombados sem qualquer valor histórico; outros, valiosos, foram-se.
– Destrói-se o casario, cerca-se, o mato cresce, mas não se constrói mais. Decadência!
– “Nossos” dois deputados correm risco sério de não se reelegerem. Isto é sério demais!
– Araguari não é tão bairrista quanto precisaria ser. Depois, reclama, chora e grita…!

Não tem lógica:
– Araguari não tem lógica nenhuma. Enlouquece ou pelo menos confunde qualquer visitante. Basta ver as ruas com os mesmos nomes triplicados ou duplicados; as ruas sem continuidade e os becos sem saída; as numerações pares e ímpares do mesmo lado e ainda aumentando e diminuindo e vice-versa; os bairros mal calculados e desestruturados, que semifavelizaram a cidade; o trânsito difícil e até irracional, não se observando as prioridades de avenidas sobre as ruas; logradouros públicos estreitos, sujos e atravancado, predominando a vontade de uns poucos ignorantes e egoístas sobre o bem geral. Estou mentindo, Terta…?

De quem é a culpa?
– De quem é a culpa pela disparada dos preços dos combustíveis? O Brasil tornou-se refém do mundo, da Petrobrás e dos seus acionistas? Ou tornou-se refém dos seus próprios erros e escolhas do passado e do presente? Até 1960, o Brasil possuía cerca de 36.000 km.de ferrovias. A partir daí, com a opção política pela construção de rodovias e pela fabricação de carros, iniciou-se o desmonte descontrolado e irresponsável desse modal quanto ao transporte de passageiros. Poucos e pequenos trechos turísticos foram preservados. Pelo restante dos trilhos, transportam-se cargas, mas muito abaixo das reais necessidades de um país continental como é o Brasil. Faltou visão de futuro…!

Leis econômicas invertidas:
– Nestas plagas, as leis econômicas básicas não prevalecem ou não funcionam. Por exemplo, a lei da oferta e da procura. Esta lei preconiza que, em havendo maior oferta de um produto, o seu preço ou baixa ou se estabiliza; havendo falta, sobe ou dispara. Bem, aqui não é assim. Quando sobra, mantém-se o preço, quando falta, sobe ou dispara. Nunca baixa. Sem falar na costumeira diminuição de qualidade, de quantidade e de confiabilidade. O brasileiro não é exigente o tanto quanto devia ser…!

Será que mudou?
– Custo de preso é 11 vezes mais caro que de aluno na escola. — A educação é o melhor caminho para conter a violência, mas a realidade é cruel. O Governo de Minas Gerais gasta R$1.700,00 (mil e setecentos reais) por mês com um presidiário. O custo de um aluno na rede estadual de ensino é 11 vezes menor: é de R$149,05 (cento e quarenta e nove reais e cinco centavos). Os valores são das Secretarias de Educação e de Defesa Social. A despesa com os condenados não é considerada exorbitante por especialistas, mas mostra o prejuízo da sociedade com o crime. O repasse de recursos federais para segurança pública caiu de R$22.000.000 (vinte e dois milhões de reais), em 2003, para R$1,3 (um milhão e trezentos mil reais), em 2.006. No Estado, subiu, no mesmo período, de R$12.300.000 (doze milhões e trezentos mil reais) para R$233.700.000,00 (duzentos e trinta e três milhões e setecentos mil reais). P. S.: matéria publicada na Coluna DJ de 05.09.2007.

 

 

O preço da fumaça:
(Sem transcrição literal)

Há muitos séculos o camelo é chamado pelos árabes de “navio do deserto”, e com toda razão; todavia, isso é outra estória.
Em um ponto central de uma das inúmeras rotas comerciais terrestres existentes no Crescente Fértil, precisamente entre as Cidades de Basra, ao Sul, e de Bagdá, ao Norte (elas ficam no atual Iraque, país devastado pela guerra e ocupado militarmente por vinte anos, mas isso também é outra estória), havia um caravançará, que é, segundo o Dicionário Aurélio, o “palácio das caravanas”, um grande abrigo no Oriente Médio, para hospedagem gratuita de caravanas e que, de ordinário, constava de quatro pavilhões em volta de um pátio, onde se encontravam caravaneiros vindos de diversos pontos.
Pois, bem! Já pelo início da noite, em um dos cantos do imenso pátio, sobre um fogo aceso, fumegava um grande caldeirão de sopa, cuja fumaça cheirosa e azulada encapava-se pelas frestas da enorme tampa.
O pobre Salim, cameleiro de uma daquelas tantas caravanas, tirou do seu bornal um pedaço de pão duro e seco, aproximou-se do caldeirão e pôs-se a passá-lo através dos halos da fumaça, como que a pretender melhorar ou suavizar-lhe o insosso sabor, impregnando-o com um pouco do cheiro daquela sopa.
Neste momento, ele ouviu bradarem ao seu lado:
– Miserável, ladrão, que Alá, e bendito seja o Todo-Poderoso, te castigue, ó cão! Fartas a minha fumaça. Prendam-no.
Era Mustafá, um dos mais ricos chefes de caravanas de Basra, que assim vociferava. Salim foi cercado e rudemente seguro por dois ou três homens, sendo levado à presença de um velho Cádi (juiz entre os muçulmanos), que vinha da capital Bagdá e que gozava de um imenso prestígio no país, possuindo, portanto, autoridade legal e moral para, falar e decidir em nome do próprio Califa e também do seu.
Disse o Cádi para Salim:
– Reconheces, ó Salim, que tiraste do teu bornal esse pedaço de pão duro e seco e que o puseste na fumaça que saia do caldeirão de sopa pertencente a Mustafá?
– Sim, Excelência, reconheço, respondeu Salim, alquebrando-se respeitoso e temeroso, já um tanto cônscio de sua própria culpa.

– E você, ó Mustafá – prosseguiu o judicioso Cádi –, desejas ser pago na exata quantidade da tua fumaça, que foi apropriada indevidamente por Salim?
– Certamente que sim, Excelência – respondeu de pronto o cúpido e avaro caravaneiro, antevendo a sua vitória naquele caso -, pois que esse estouvado cameleiro surrupiou um bem que legitimamente me pertence, ainda que a minha preciosa fumaça estivesse a esvair-se pelo ar.
O doutor juiz ordenou, então, a Salim, que tomasse numa de suas mãos o seu pequenino saco de moedas, desatando-o do cinto, e que o sacudisse bem, de forma alta e forte, fazendo com que as parcas e ínfimas moedas de cobre existentes no seu interior tilintassem bem alto.
Salim fez exatamente o que lhe fora ordenado, e as suas míseras moedas de cobre tilintaram fortemente, podendo todos os presentes àquele insólito julgamento ouví-las em alto e bom som.
Disse o Cádi:
– E tu, ó Mustafá, ouviste bem o tilintar sonoro das moedas de Salim?
– Sim, Excelência, eu ouvi muito bem.
– Tens certeza absoluta disso, ó Mustafá? Pena muito bem no que vais me dizer, porque da tua resposta irá depender a sorte deste teu caso com Salim.
– Por Alá, Excelência, e bendito seja o nome do Altíssimo, ouvi muito bem o tilintar das moedas, pois não sou surdo.
Ante uma afirmativa tão peremptória, sentenciou o venerando Cádi:
– Em nome de Alá, Ele é nosso Deus e Maomé é o seu maior Profeta, e por delegação do nosso glorioso Califa, a quem represento, e já que ouviste bem o tilintar das moedas de Salim, eu te digo, ó Mustafá, que tu estás inteiramente pago e que nada mais poderás reclamar de Salim pelo uso que ele fez da tua “preciosa” fumaça.
E, concluindo:
– Todas estas pessoas que nos rodeiam testemunharam comigo que tu disseste ter ouvido o tilintar das moedas, quando agitadas por Salim. E, aprende, ó Mustafá, para o resto da tua desprezível vida, que todo aquele que se arvora no direito de cobrar de seu semelhante pelo uso do cheiro de uma fumaça, que se esvai de um caldeirão a cozinhar uma sopa, deve contentar-se em ver-se inteiramente pago pelo tilintar de moedas que sai de dentro do saco que as contêm.

E, por fim, o respeitável Cádi disse de forma peremptória:
. Repito, estás pago, ó Mustafá. Vai-te, pois, logo deste lugar

FONTE: Malba Taham.

Observação:

Não pretendo fazer um tratado filosófico, nem mesmo uma digressão extensa acerca das eventuais e cabíveis lições de moral encerradas neste conto do insigne Malba Taham, que tanto preencheu as fantasias da nossa criancice e da nossa adolescência e que ainda nos guiam; autor de “O Homem Que Calculava”, “Lendas do Céu e da Terra”, “Céu de Alá” e das “Mil Estórias do Rei Baribé”, e de tantas outras deliciosas e edificantes obras de cunho ou feitio oriental.

Em “O preço da fumaça”, cumpre-nos concluir que a Justiça não deve cingir-se, atrelar-se ou preocupar-se com mesquinharias, com bagatelas ou com insignificâncias, pois o seu conteúdo e alcance são muito maiores do que isso.

Além do mais, e sempre, ela – a Justiça — deve ser aplicada de acordo com o caso concreto, sendo permeada pelo comedimento, pelo bom-senso pela imparcialidade, pela razoabilidade e pela prudência e autoridade legítima do seu aplicador.

De tal sorte:

– Pois que, se me cobras o cheiro da fumaça que se esvai no ar, receberás o tilintar das minhas moedas…!

• Rogério Fernal

 

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